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"Nitrificação em pH Ácido: Como as Plantas Podem Ser o Verdadeiro Filtro Biológico nos Aquários Plantados"
Durante muito tempo, foi aceite como regra que a nitrificação — processo essencial do ciclo do azoto nos aquários — não ocorria eficazmente em ambientes ácidos.
No entanto, um estudo publicado por Schramm et al. (1998) e agora mais recentemente "Nitrification in a Biofilm at Low pH Values: Role of In Situ Microenvironments and Acid Tolerance", publicado em 2006 por Armin Gieseke, Sheldon Tarre, Michal Green e Dirk de Beer veio demonstrar que, em certas condições, as bactérias nitrificantes conseguem adaptar-se e manter a sua atividade mesmo em pH tão baixos quanto 5,0.
Curiosamente, muitos de nós, aquariofilistas com experiência em aquários plantados já observavam este fenómeno na prática, mesmo sem a validação científica: os aquários funcionavam, os parâmetros mantinham-se estáveis e os peixes prosperavam, mesmo com pH consideravelmente ácido.
Com base nesta constatação — agora apoiada pela ciência, "quanto baste" — que comecei a questionar algo que sempre me intrigou: será que, em ambientes plantados e com pH ácido, faz mesmo sentido continuarmos a ver as plantas apenas como consumidoras finais de nitrato? Ou não será mais lógico pensarmos nelas como parte ativa da filtragem biológica, sobretudo pela sua capacidade de absorver diretamente o amónio (NH₄⁺), uma fonte de azoto menos tóxica e metabolicamente mais eficiente para as plantas?
E é com base nesta linha de raciocínio, sustentada pelos estudos que partilho no final do texto, que trago hoje esta reflexão. Não pretendo apresentar verdades absolutas até porque neste Hobby poucas devem haver, mas antes lançar uma hipótese para que cada aquariofilista possa ponderar, observar e, se fizer sentido, tirar as suas próprias conclusões. No meu caso, com base na experiência prática nos meus aquários plantados, esta abordagem tem funcionado de forma consistente e surpreendentemente eficaz.
Nitrificação em Ambientes Ácidos: Como as Bactérias se Adaptam
O QUE É NITRIFICAÇÃO?
A nitrificação é um processo natural onde bactérias transformam amónia (NH₃) em nitrito (NO₂⁻) e depois em nitrato (NO₃⁻), ajudando a manter a água saudável para peixes e plantas.
O QUE FOI DESCOBERTO?
Um estudo científico demonstrou que biofilmes nitrificantes conseguem funcionar mesmo em águas muito ácidas (com pH por volta de 4), algo que antes se pensava impossível.
COMO ISSO É POSSÍVEL?
Os cientistas testaram duas ideias:
RESULTADOS:
Estas bactérias adaptaram-se ao ambiente ácido com:
COMO FUNCIONA O EQUILÍBRIO?
O QUE ISTO SIGNIFICA PARA A AQUARIOFILIA?
Mesmo em águas com pH baixo, é possível manter a nitrificação ativa — desde que haja biofilmes saudáveis e tempo para adaptação, algo que já acontece nas nossas "ceramicas" ou materias filtrantes dos nossos filtros
Apoiar bactérias como Nitrospira spp. e Nitrosospira spp. pode ser essencial em sistemas com pH naturalmente ácido (como biótopos amazónicos), como por exemplo nos dias das TPAS adicionar activadores biologicos de forma a estabilizar novamente a colonia de bacterias na altura onde há mais variação de parametros, durante as trocas de água.
Fonte: Estudo: "Nitrification in a Biofilm at Low pH Values: Role of In Situ Microenvironments and Acid Tolerance"Journals ASM+2ResearchGate+2PubMed Central+2
Estudo: "High-Rate Nitrification at Low pH in Suspended- and Attached-Biomass Reactors"
As Plantas Como Filtro Biológico em Aquários Plantados com pH Ácido: Um Novo Olhar Sobre a Nitrificação
Quando falamos em filtragem biológica nos aquários, é comum pensarmos nas colónias de bactérias que habitam os materiais porosos do filtro, encarregues de transformar os compostos tóxicos do ciclo do azoto — como a amónia — em substâncias menos perigosas como o nitrato. No entanto, em aquários plantados de aquascaping, especialmente aqueles com pH ácido, há um fenómeno interessante que merece a nossa atenção: o papel ativo das plantas como parte fundamental da filtragem biológica.
O Ciclo do Azoto e o Papel das Bactérias
Em condições normais, o ciclo do azoto é movido por dois grupos de bactérias:
Este processo é sensível ao pH da água. Estudos mostram que em ambientes com pH abaixo de 6,0, a atividade destas bactérias abranda consideravelmente, podendo mesmo parar se o pH atingir valores próximos dos 5,0. Contudo, alguns estudos recentes, incluindo aquele que estamos a analisar, indicam que se a transição para esse pH for gradual e o ambiente se mantiver estável, as bactérias conseguem adaptar-se parcialmente, continuando a nitrificar mesmo em meios ácidos — ainda que a um ritmo muito inferior ao habitual.
Amonía vs Amonio: A Importância do pH
A forma sob a qual a amónia se apresenta na água depende fortemente do pH. Em pH neutro ou alcalino, predomina a forma NH₃ (amónia), altamente tóxica para peixes e invertebrados. Já em pH ácido, o equilíbrio químico favorece a forma NH₄⁺ (amónio), que é consideravelmente menos tóxica.
E aqui entra a questão-chave: as plantas preferem o NH₄⁺ ao NO₃⁻ como fonte de azoto. A assimilação do amónio pelas plantas requer menos energia do que a do nitrato, o que significa que em ambientes com pH ácido, onde a amónia é convertida naturalmente em amónio, as plantas encontram uma fonte de azoto ideal — desde que o equilíbrio do sistema seja respeitado.
O Papel das Plantas em Aquários com pH Ácido
Num aquário de aquascaping com injeção de CO₂, fertilização controlada e pH naturalmente ácido (frequentemente entre 5,5 e 6,2), pode ocorrer o seguinte cenário:
Ou seja, neste tipo de sistema, as plantas não são apenas consumidoras de nitrato, mas tornam-se filtradoras ativas do amónio, reduzindo a pressão sobre as bactérias nitrificantes e ajudando a manter a qualidade da água de forma eficiente.
Uma Nova Perspetiva sobre a Filtragem Biológica
Este entendimento leva-nos a repensar a forma como olhamos para a filtragem biológica em aquários densamente plantados e com pH ácido. Embora os filtros com cerâmicas e colónias bacterianas continuem a ser importantes, não devem ser o único foco da "ciclagem" neste contexto. As plantas passam a ser parte integrante da estratégia de controlo de compostos nitrogenados — especialmente quando as condições favorecem a permanência do amónio na coluna de água.
É claro que o sistema deve ser cuidadosamente equilibrado: excesso de matéria orgânica, sobrealimentação ou poda incorreta podem levar à acumulação de compostos que nem bactérias nem plantas conseguem processar a tempo. Mas, quando bem montado e mantido, este tipo de aquário representa um ecossistema altamente eficiente e estável.
Conclusão
Em aquários plantados com pH ácido, como os de aquascaping com injeção de CO₂, faz cada vez mais sentido olhar para as plantas como um componente essencial da filtragem biológica. Ao compreender melhor os efeitos do pH na nitrificação e a preferência das plantas pelo amónio, podemos otimizar o funcionamento natural do aquário, reduzir o stress sobre a fauna e alcançar um equilíbrio ecológico mais inteligente.
Publicação feita por Ivo Lança Soares 03/04/2025
Fontes:
Equilíbrio entre Amónia e Amónio Dependente do pH: